quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

14 – Sair da frigideira para cair no fogo!

Um no cravo e outro na ferradura! Pra dizer a verdade, nunca entendi direito o significado deste dito popular. Talvez por não ter sido citado por minha avó materna.
Mas parece indicar o uso de argumentos diversos ou dúbios. Mas isto não vem ao caso no momento. Alguns dias atrás foi o tal de Réveillon. Era um dia 31 de dezembro que rotineiramente volta e tenta ajudar a vender roupa branca. O comércio agradece!
Estava eu conversando com uma amiga, "by net", e ela me deu a receita de um suco voltado para sanar anemia. Seria “tiro e queda”! O marido dela havia tomado quando fazia quimioterapia e teria funcionado de forma substanciosa.
Em casa estamos passando por um processo semelhante com uma parente, que vem passando por seções de quimioterapia. Quando comentei com esta amiga, ela me passou a tal receita, que envolvia laranja, couve, beterraba e fígado de galinha, tudo batido no liquidificador e coado em pano.
Eu me entusiasmei, como se tivesse estado diante de uma “epifania”[1]. Tão loco cruzei com minha esposa fui contar a receita que havia sido passada a mim. Logo que “dei a primeira no cravo”, “levei uma na ferradura”.
“Você não sabe que ela não pode comer laranja?”. De pronto, abaixei as orelhas, até me sentindo meio asno, por não saber que quem faz quimioterapia não pode “tomar nada cítrico” (usando as palavras ouvidas). Minha primeira reação foi de me questionar pelo fato de não ter consultado primeiro no “oráculo googleano” se podia ou não laranja. Mas aquelas sinapses produtivas que acionam a memória, me levaram a um passado recentíssimo, onde a receita me foi passado para o caso justamente de quimioterapia!
A minha primeira conclusão foi a de que “existem quimioterapias e quimioterapias!”, de tal sorte de que haveria um tipo “laranjofílico” e outro “laranjófobo”. E a tal amiga desconhecia tais diferenciações. De qualquer forma louvei a dica e deixei registrado que se fosse passar a receita adiante, consultaria primeiro sobre eventual “incompatibilidade cítrica”.
O tal do trinta e um passou com suas rotinas tradicionais, finalizando com uma ceia de passagem de ano. Evidentemente a parente que esta a fazer quimioterapia não poderia beber nada alcoólico. Pelo menos isto passava pelo meu imaginário.
Minha esposa serviu para ela uma garrafa de suco de laranja Xandó! Cito a marca não como marketing, mas para demonstrar que uma eventual alucinação pode ser completa; muito além do que possa supor um vã processo alucinatório genérico!
A cena parecia real. Tinha todo um arcabouço de realidade. Eu até toquei na garrafa e comentei vagamente algo sobre o produtor do suco, coisa e tal. A cena em si tinha tudo para ser real.
Bem, em sendo real, a ocorrência da “censura cítrica” teria sido, então, uma alucinação! Simples assim! Se um era o real o outro seria o imaginário! Eventualmente, em um processo alucinatório múltiplo (não sei se existe, mas seria bem o caso), os dois eventos seriam alucinação, de tal sorte que eu teria passado um período de cerca de 12 horas em processo alucinatório!
Relembrei fatos outros passados durante este período. E pareciam todos reais! Teria sido um processo de “alucinação realística”?
Fiquei com uma pulga de proporções incômodas atrás da orelha. Tanto que quando fui dormir, fiquei analisando os fatos. Resolvi partir do princípio que não teriam sido duas alucinações conectadas em seu conteúdo.
Imaginei que pudesse ser um processo onde uma alucinação (a segunda) fosse compensatória em relação ao primeiro fato, que teria sido o gerador de um processo de frustração!
Mas justamente o segundo ocorrido contava com detalhes e requintes que pareciam conduzir a uma percepção de realidade!
Se tentarmos inverter a situação, eu corria sério risco de em outro contato com a tal amiga eu ficar tentado e checar se nossa conversa tinha realmente ocorrido. É uma risco que se corre! Mas como me recordei que ela já havia comentado da tal receita em ocasiões anteriores, achei prudente não “creditar na coluna de alucinações”.
Fiquei na dúvida de qual teria sido a alucinação. Fiz conjeturas sobre as duas hipóteses básicas e mais a terceira do duplo evento alucinatório!
Como não conseguia me decidir por uma hipótese como mais adequada, me passou no processo construtivo a possibilidade de ambos os eventos serem reais!
Senti um calafrio correndo o corpo. Achei mais prudente ligar a televisão como o timer, fechar os olhos e dormir. Felizmente não me lembrei no dia seguinte do que teria sonhado naquela noite!





[1] Epifania – revelação divina