10 . Sim, eu tenho cara
de otário
Acho
que desde o episódio de Ouro Preto, quando uma aprendiz de quase suposto guia
de turismo quis me vender um pedaço da corda que enforcou Tiradentes, que eu
não lido bem com situações onde me contam histórias cujo enredo parece implicar
em eu fazer o papel do otário, do otário praticante.
Recentemente
me envolvi no desenvolvimento de um projeto educacional para uma determinada
categoria profissional. Entrei de cabeça! Sei que é estranho dizer que acredito
em transformações através da educação, mas acredito. Acredito que e educação
pode ser revolucionária e transformadora.
Segundo
costumo ouvir de conhecidos, acreditar em educação, em revolução ou transformação
social é coisa de otário. Mas não é disto que quero falar no momento.
Este projeto
que abracei vem tendo altos e baixos e não tem se desenvolvido na velocidade
que eu gostaria que andasse. Mas, até onde percebo, não é por minha causa que
isto ocorre.
Uma
irmã de minha esposa, vinha residindo na Europa há muitos anos. E o velho
continente vem passando por uma recessão brava. E nestes momentos a culpa
costuma ser de quem? Dos imigrantes, claro.
Então
ela vinha fazendo planos de voltar para o Brasil. Minha esposa me perguntou se
eu poderia incluir ela no projeto, como forma de se reintegrar ao mercado de
trabalho, no Brasil.
Como
sempre eu me propus a ajudar. Na verdade, tenho um estranho hábito de não
deixar de ajudar ninguém. Já me disseram que isto é sintoma de altos índices de
“otarimicina” no sangue.
Para
encurtar a história, ela voltou para o Brasil e, como disse acima, o projeto
não anda na velocidade que eu gostaria. Em alguns momentos fui cobrado por qual
motivo eu não tinha “mandado” contratarem ela. Eu me questionei sobre meu
poder. Será que tenho tanto poder assim e não estou sabendo? Estou tentando
equilibrar a minha situação e posição, e creio não estar em condições de “dar
ordens”.
Faço
aqui uma digressão. Quando saí de uma ONG onde trabalhava, estava procurando
uma colocação e fui ao CAT (Centro de Amparo ao Trabalhador), mantido pela
Prefeitura. O sujeito que me atendeu, buscou averiguar minhas qualificações e
fazer cruzamento com as vagas existentes. Ao final ele me disse que tinha uma
vaga de atendente de uma loja de conveniência.
Ao
chegar em casa comentei o resultado, e fui “premiado” com a informação de que
eu era tão incompetente que não tinha sabido achar uma vaga melhor. Eu havia
presenciado o rapaz que me atendeu cruzar informações de diversas formas e
entendia que não teria havido erro de procedimento. As vagas disponíveis lá é
que me pareciam com um baixo nível de qualificação necessária.
Não
me esqueço que fui “incentivado” a aceitar a vaga. Havia uma indicação de que
deveria começar como tal e que eu poderia ter uma “ascensão meteórica”. Sei que
geralmente tenho a tendência de acreditar no que as pessoas dizem, mas naquele
dia, confesso que não consegui.
Cheguei
a comentar com um amigo, ao que ele me disse: Você não acha que as vagas de
mais qualificação são encaminhadas para lá, acha?
Senti
um certo sarcasmo na pergunta. Aquela ironia parecia reforçar o meu “lado
otário”.
Mas
para todos os efeitos eu era o tal otário que não sabia procurar uma colocação
na tal entidade de recolocação no mercado de trabalho.
Em
determinado momento fui questionado sobre a tal vaga que eu deveria fazer
surgir. Confesso que havia tentado uma colocação em área administrativa, mas
com o andamento do projeto, tivemos de montar uma estrutura substancialmente
menor em outro lugar, que não o inicialmente previsto.
Comentei
com minha esposa que naquele momento só teria como conseguir uma vaga como recepcionista.
A pergunta que me foi feita foi: “Dá uns R$ 3.000 pelo menos?”
Como
percebi que havia certa dose de seriedade na pergunta, evitei rir e logo
respondi que seria bem menos do que aquele valor.
Não
comentei o fato com ninguém, pois seria chamado de mentiroso. Se me contassem,
eu seguramente não acreditaria.
Passados
alguns dias eu voltei à carga e perguntei que aquela posição iria interessar,
quando surgisse.
Eu
expliquei que a remuneração seria menor que R$1.000 e que era o que eu poderia
conseguir naquele momento. Mas me lembrei que seria uma remuneração semelhante
a que me ofereceram para ira trabalhar na tal Loja de Conveniência. Pela “lógica”,
seria interessante. Mas comentei que ela poderia ir procurar no tal órgão da
Prefeitura, e seguramente ela saberia procurar muito melhor do que eu e
arrumaria uma colocação infinitamente melhor.
O que
se seguiu na conversa beira a uma alucinação. Minha esposa disse que ela tinha
voltado da Europa por que eu tinha oferecido uma vaga para ela no projeto. Eu
tinha apenas dito que iria ajudar no que fosse possível. Mas pareceu que meu
poder havia sido superestimado em demasia! Foi-me dito que ela não iria
procurar em outro lugar, uma vez que ela havia “se comprometido comigo” e de
modo algum iria falhar.
Eu
que “sou mais bobo” iria procurar algo melhor se tivesse oportunidade. Será que
ela era mais otária que eu??? Não, não creio. E eu? Se acreditasse na história,
qual qualificação teria?